Publicidade

Ucrânia: Putin pode ser punido apenas quando não for mais presidente

Ex-juíza de Haia explica como funciona a investigação de possíveis crimes de guerra praticados pela Rússia

Ucrânia: Putin pode ser punido apenas quando não for mais presidente
Publicidade

As denúncias feitas pelo governo ucraniano sobre as ações do exército russo no país continuam repercutindo internacionalmente e gerando revolta em grande parte dos países. Acusados de bombardear áreas residenciais e assassinar centenas de civis durante a ocupação de cidades, como Bucha, comandantes e soldados do Kremlin podem ser investigados por crimes de guerra e, até mesmo, contra a humanidade, assim como o líder da ofensiva, o presidente Vladimir Putin. Neste caso, a entidade responsável pelo processo é o Tribunal Penal Internacional.

+ Leia as últimas notícias no portal SBT News

De acordo com Sylvia Steiner, ex-juíza da Corte, para que a denúncia do governo da Ucrânia seja levada adiante é preciso que as imagens divulgadas dos corpos espalhados por Bucha, nos arredores de Kiev, e outras cidades, como Kramatorsk e Mariupol, sejam analisadas e comprovadas. Posteriormente, deve haver uma apuração para identificar um número razoável de vítimas e, consequentemente, uma perícia para detectar a data e causa da morte do grupo de civis. Com os dados, um laudo cadavérico deve ser desenvolvido, mostrando se houve tortura e se a munição disparada contra o indivíduo ocorreu depois ou antes da morte.

"Nós vimos as imagens do que se alega ser um massacre, e pessoas mortas pelas ruas, muitas delas com as mãos amarradas nas costas, com sinais de tortura, com tiros dados por trás da cabeça, o que é típico de execução. Essas imagens são o que nós chamamos, no processo penal, de início de prova, que tem que ser corroborada agora pelas provas documentais, provas testemunhais e, principalmente, neste caso, por provas periciais. Caso forem confirmadas, isso confira, sem dúvida, em crime de guerra e até mesmo contra a humanidade", explica Sylvia

Na definição do Direito Internacional Humanitário, um crime de guerra acontece quando civis não são distinguidos das tropas militares, quando os danos à população não são minimizados e quando ocorre uma destruição desnecessária com sofrimento prolongado. No entanto, diferente dos crimes contra a humanidade, que acontecem somente contra civis, os crimes de guerra também podem ocorrer contra militares, quando há casos de tortura, sequestros, prisão ou experimentos na ordem biológica.

Estação ferroviária de Kramatorsk após ataque russo | Divulgação/Governo da Ucrânia

No caso da Ucrânia, a comprovação das evidências pode resultar na investigação e denúncias contra toda a cadeia de comando russo, que engloba Putin, ministros de Estado, coronéis e soldados. A penalização pelos atos, no entanto, pode ser dificultada, uma vez que o Tribunal não tem permissão para realizar um julgamento à revelia, ou seja, na ausência dos acusados. 

"Se por uma hipótese, ao final das investigações, o procurador pedir a expedição de mandados de prisão contra o grande escalão russo, a ação penal propriamente dita só poderá começar quando essas pessoas foram presas e entregues à Corte. Enquanto isso, enquanto eles não forem presos e nem entregues, a ação penal fica suspensa", diz Sylvia. "Então, há, sim, uma possibilidade da denúncia contra Putin, mas falar em penalização é um pouco precipitado, porque temos que ver, primeiro, contra quem o mandado será expedido e, segundo, quem vai prender e entregar os acusados ao Tribunal para que eles possam ser devidamente julgados."

+ Membros da ONU decidem suspender Rússia do Conselho de Direitos Humanos

Para que isso aconteça, a ex-juíza esclarece que todos os Estados que ratificaram o Estatuto de Roma - tratado que estabeleceu a Corte Penal Internacional - têm a obrigação de cooperar com as investigações e exigências da Corte. Para exemplificar, Sylvia cita o caso do ex-presidente do Sudão, Omar al-Bashir, que foi acusado pelo Tribunal por crimes de guerra e crimes contra a humanidade em 2009, devido ao conflito na região de Darfur. O combate, que acontece até hoje entre grupos milicianos e povos não árabes, já deixou mais de 400 mil mortos, segundo estimativas.

"É muito difícil você prender um presidente de Estado e de um Estado em exercício. Então, o que normalmente se tem que fazer é aguardar que essa pessoa não esteja mais no poder para que possa ser presa e entregue ao Tribunal. Por outro lado, como no caso de al-Bashir, ele ficou praticamente sem poder sair do Sudão, porque a maior parte dos países africanos são signatários do Estatuto de Roma. Então, se ele pusesse os pés num país signatário do Estatuto ou na Europa, ele seria preso e entregue à Corte. Isso faz com que o presidente fique bastante restringido nos seus movimentos, na sua capacidade de ir e vir e de se relacionar com outros chefes de Estado", conta.

Ao fim de um processo penal, os membros do Tribunal expedem duas decisões, sendo uma sobre a condenação e aplicação da pena, que, às vezes, é separada da condenação, e uma sobre a reparação das vítimas - fazendo com que a Corte tenha dupla função. Em grande parte dos casos, o condenado afirma não ter como reparar as vítimas. Para que a pena prevista seja realizada, o Tribunal pode pedir a apreensão de bens e congelamento de contas. Se ao final ainda não houver o valor estipulado, a Corte pode utilizar de um fundo no qual todos os signatários depositam valores destinados à reparação das vítimas. O recurso, que compõe uma espécie de indenização, também pode ser destinado para a reconstrução de cidades, reabilitação de pessoas feridas e projetos de habitação.

+ Guerra custará mais de US$ 1 trilhão à Ucrânia, diz primeiro-ministro

Desde o início da ofensiva russa na Ucrânia, em 24 de fevereiro, 41 dos 122 Estados signatários do Estatuto de Roma solicitaram a abertura de uma investigação sobre os ataques realizados contra civis. Apesar de não ser signatário, assim como a Rússia, quando houve a anexação da Crimeia (2014), a Ucrânia depositou uma declaração aceitando voluntariamente à jurisdição do Tribunal. Com isso, quaisquer crime de guerra ou crimes contra a humanidade que aconteçam no território podem ser investigados pela Corte.

Com a recente invasão à Ucrânia, a Rússia passou a ser alvo de dois processos no Tribunal Penal Internacional por crimes praticados no território vizinho, sendo um em relação a Criméia, que, conforme balanço da Organização das Nações Unidas (ONU), deixaram mais de 9 mil mortos, e outro por conta dos recentes desdobramentos do cerco russo e o número ainda incontável de vítimas civis.

Confira essa e outras notícias sobre a guerra na Ucrânia na edição semanal do Mapa Mundi:

Leia também

+ Japão suspende importação de carvão russo e expulsa diplomáticos

+ Maldade sem limites, diz Zelensky sobre ataque russo à estação ferroviária

+ Congresso dos EUA aprova embargo ao petróleo da Rússia

Publicidade
Publicidade

Assuntos relacionados

sbt
sbtnews
portalnews
guerra-na-ucrania
vladimir putin
sera
punido
quando
nao
for
presidente
crimes de guerra
crimes contra a humanidade
tribunal penal internacional
ataques
mortes
civis
investigaçao
giovanna colossi
camila-stucaluc

Últimas notícias

Joelma, Léo Santana, Raça Negra: Virada Cultural de SP divulga lista de atrações

Joelma, Léo Santana, Raça Negra: Virada Cultural de SP divulga lista de atrações

Evento acontece entre 18 e 19 de maio em palcos espalhados pela cidade
Tradição dá errado e mulher é atingida por jarro na cabeça na Grécia

Tradição dá errado e mulher é atingida por jarro na cabeça na Grécia

Cena foi registrada e compartilhada nas redes sociais
Atacante Jô, do Amazonas, é preso em Campinas por não pagar pensão

Atacante Jô, do Amazonas, é preso em Campinas por não pagar pensão

Polícia Civil cumpriu mandado contra o jogador ao desembarque do time para partida contra a Ponte Preta
Chuvas no RS: Jacarezinho tem cenário devastado por inundação

Chuvas no RS: Jacarezinho tem cenário devastado por inundação

Distrito no Vale do Taquari foi duramente atingido por chuvas. Moradores relatam momentos de desespero
Ministério da Saúde lança campanha anual de doação de leite materno

Ministério da Saúde lança campanha anual de doação de leite materno

Meta para 2024 é ampliar mais 5% a oferta de leite materno a recém-nascidos internados nas unidades neonatais do país.
Prefeito de Porto Alegre pede que moradores deixem bairros Cidade Baixa e Menino Deus

Prefeito de Porto Alegre pede que moradores deixem bairros Cidade Baixa e Menino Deus

Quem conseguiu escapar escolheu o litoral norte gaúcho como destino, e as poucas estradas sem bloqueios ficaram congestionadas
Alunos de colégio do Rio apresentam projeto inovador na Universidade de Harvard

Alunos de colégio do Rio apresentam projeto inovador na Universidade de Harvard

Jovens criaram um aplicativo com dicas para abordar assuntos que ainda são vistos como tabu
Câmara aprova decreto de Lula e reconhece estado de calamidade pública no RS

Câmara aprova decreto de Lula e reconhece estado de calamidade pública no RS

Mudança flexibiliza regra para envio de recursos de forma emergencial ao estado; texto agora segue para o Senado
Lira diz que situação no RS é chocante e pede fim de politização para apoio ao estado

Lira diz que situação no RS é chocante e pede fim de politização para apoio ao estado

Após viagem ao estado, presidente da Câmara afirmou que deputados querem dar rapidez às propostas de apoio ao estado
TST faz proposta para encerrar greve em hospitais universitários

TST faz proposta para encerrar greve em hospitais universitários

A categoria tem até as 17h desta terça-feira para se manifestar sobre as condições apresentadas
Publicidade
Publicidade