Brasil é exemplo mundial de diversidade nas plataformas digitais
Sandro Mendonça, da reguladora portuguesa, acha que mundo tem que aprender com modelo brasileiro
Enquanto o mundo inteiro discute os limites e as possibilidades efetivas para regulação das plataformas digitais, o Brasil pode passar de coadjuvante internacional a exemplo global. A avaliação é de Sandro Mendonça, conselheiro da Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom), o equivalente à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) no Brasil.
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O ponto de partida é o momento de virada que as relações humanas vivem filtradas pelas imposições da tecnologia e da internet. A própria rede mundial de computadores, e a forma como as sociedades a utilizam, passam por transformações a todo instante: e as adaptações e novas possibilidades abertas percorrem as trocas de mensagens e as formulações de negócios cada vez mais aceleradas. Daí a necessidade de se implementar parâmetros para o desenrolar dos efeitos desta revolução.
"O que temos na Europa de uns anos pra cá é a tentativa de assegurar melhor governança de dados, melhor governança de privacidade, e nessa viragem para a década de 2020 tivemos a instalação de alguns atos normativos. O que está havendo é um assentamento desta nova abordagem e uma busca por experimentar como se vai implementar. É o momento em que nós estamos e o momento em que há alguma rima com o momento brasileiro. Um encontro a perguntar: o que faremos nós com tanta conectividade?", propõe Sandro Mendonça.
Dono do limite
Um dos desafios impostos pela realidade das plataformas - cada vez mais presentes na rotina diária das pessoas - é proposto para a comunidade internacional a partir de uma constatação concreta: para as plataformas, o serviço oferecido aos usuários é um negócio. Logo, a presença intensiva da sociedade nas redes gera um "poder de fogo" às Big Techs, as transformam em reguladoras do próprio negócio. Vem daí tanta resistência e dificuldade para se chegar a uma proposta de regulação destes serviços e desta atuação das "donas " do mercado. Os efeitos avançam sobre a vida do cidadão comum em seu dia-a-dia, elabora Sandro Mendonça.
" Essas plataformas no fundo são donas em um ambiente em que temos usuários mas também temos produtores. As grandes plataformas digitais, na prática, já são reguladoras e donas do seu próprio espaço. Daí que fora da vida digital, e para a vida econômica, esse tipo de poder já é exercido. Portanto, regular de fora para dentro é um desafio. Temos instituições que têm políticas regulatórias, que imporiam obrigações. Essas plataformas não devem ser vistas como algo que quebra a originalidade livre da internet, porque a internet mudou. O consumo espontâneo da internet é através de mediadores. Intermediários que têm poder de mediação significativos. Porque são bolhas. Todos vivemos em bolhas. E, portanto, consumimos conteúdos dentro de um regime que é ditado pelo dono da plataforma" - Sandro Mendonça, Anacom
Produção local
A capacidade brasileira de gerar pequenos provedores, que atendem a pequenas ruas distantes e a um número menor de clientes, é um destaque que o executivo faz questão de salientar. Em regiões menos assistidas, diz ele, essas empresas de pequeno porte se valem principalmente da proximidade com o cliente, com conhecimento técnico e fidelidade. É uma identidade "local" do negócio dos provedores brasileiros. Que pode e deve ser exemplo para o mundo, avalia Sandro Mendonça. " O mundo deve aprender mais com o exemplo brasileiro, este impulso endógeno nacional", sentencia ele. Mendonça é ainda hoje conselheiro de altos estudos da Anatel brasileira. E acha que a maneira made in Brazil de regular as plataformas - ou de buscar esta regulação - já chama atenção no planeta.
" O mundo está a olhar para o Brasil. Uma solução integrada pode vir do Brasil . E essa solução que o país está a encontrar pode passar por termos um regulador, a Anatel, com alguma capacidade de entrar nesta arena digital, porque temos Google, temos Meta, temos Amazon, e estas entidades gigantescas estão na arena. Nós precisamos estar na arena para defender os interesses de quem não tem poder para lidar com aqueles monstros. Nós precisamos de um gladiador. A Anatel pode ser uma tentativa de termos alguma disciplina. Eu estive vários anos na regulação. Na Anatel eu aprendi a admirar muito a agência, são servidores altamente capacitados que tem alinhamento com os interesses do povo brasileiro. Nós temos que dar poder a estas instituições, que têm capacidade técnica e visão estratégica. E existem, além da Anatel, outras instituições brasileiras de grande poder de fogo que são exemplos para o mundo. E os brasileiros nem sempre sabem".
Diversidade digital
Os grandes blocos econômicos, como Estados Unidos e Comunidade Européia, estão em busca de afirmação em espaços de influência. E vão ter de encarar o Brasil provedor - e regulador -, pensa Mendonça.
" Eu creio que com o Brasil eles tem que esbarrar com uma identidade cultural afirmativa que sabe zelar pelos seus próprios interesses, e o mundo precisa disso, dessa pluralidade. É mais riqueza para o mundo todo. Quando temos um Brasil que se afirma no mundo todos ganham: ganha o povo brasileiro mas também ganham outras geografias, e o Brasil consegue ser capaz dessa diplomacia, de gerar entendimentos, eu tenho crença neste Brasil" - Sandro Mendonça
Que venha o 6G
E para tudo funcionar a contento, a atualização tecnológica é indispensável. Para o executivo, o 5G ainda não entregou tudo o que se espera. Mas ...já se espera o 6G.
" Até agora não, não sei se é maldição dos números ímpares, porque o 2G foi ótimo, com o 3G não houve nada, o 4G foi muito impactante, o 5G até agora estamos a experimentar. O 6G está em fase de experimentação e eu estou a crer que será possível a comunidade de cientistas e os engenheiros moldarem o 6G à imagem dos interesses dos brasileiros também".
Confira a entrevista na íntegra:
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