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Sonhos cortados: o pesadelo da medicina estética na capital federal

SBT News reúne dez relatos de mulheres do DF que acusam a mesma cirurgiã plástica de negligência médica

Sonhos cortados: o pesadelo da medicina estética na capital federal
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Os anos de 2020 e 2021 ficarão marcados para sempre na vida de 20 mulheres do Distrito Federal. Elas acusam uma mesma cirurgiã plástica de negligência médica, depois de procedimentos estéticos malsucedidos que acarretaram problemas físicos e psicológicos. A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) apuram os fatos após a maior parte do grupo ter registrado boletim de ocorrência. 

A médica, Milena Carvalho, possui registro no Conselho Regional de Medicina desde junho de 2011. A cirurgiã é proprietária de uma clínica particular no Lago Sul, área nobre de Brasília. Os procedimentos estéticos eram realizados no Centro Clínico do Jardim Botânico, outra região de alto padrão da capital federal.  Em 16 de dezembro de 2021, a Vigilância Sanitária do DF interditou o centro clínico depois que agentes encontraram diversas irregularidades.

Nas redes sociais a médica tinha mais de 25 mil seguidores e publicava vários conteúdos voltados à estética.  Porém, apagou o perfil após as denúncias. No site do Conselho Regional de Medicina consta que a situação da cirurgia é regular, embora a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) afirme que a profissional foi retirada do quadro de membros.  

Rede social da médica acusada de mal atendimento | Reprodução/Instagram

Dez mulheres relatam com exclusividade ao SBT News episódios conturbados vividos com a mesma profissional de saúde. Para preservar a identidade das denunciantes, a reportagem usou nomes fictícios. 

Trauma após dois anos de espera

Marcella economizou durante dois anos para conseguir realizar o sonho de uma mamoplastia redutora com inclusão de próteses de silicone e lipoaspiração no abdômen. O objetivo era ter o corpo que sempre imaginou. Se olhar no espelho e ver a imagem que iria aumentar a própria autoestima, lhe dando mais confiança e alegria. No entanto, da noite para o dia viu o sonho se tornar pesadelo.

Na manhã do dia 17 de março de 2021, ela estava deitada em uma maca, dentro de uma sala do Centro Clínico do Jardim Botânico pronta para os procedimentos estéticos. A ansiedade era grande pela cirurgia que, imaginava, mudar de vez a vida. Assim que a operação terminou e os sinais foram retornando com o fim do efeito da anestesia, começaram os primeiros problemas. 

"Após a cirurgia eu passei a ter queda de pressão e anemia. Os pontos dos meus peitos abriam todos os dias. Fiquei com os seios abertos. Fui mais de seis vezes à clínica. Depois de várias idas e vindas, começou a ter pus nos meus peitos. Ele estava necrosando muito. Teve um dia que estava sangrando tanto que eu acordei com a minha cama encharcada, minha roupa toda molhada de sangue", relata Marcella.

No dia do sangramento mais intenso e desesperada com a situação, o marido de Marcella a levou à clínica médica, já em estado de choque.  A cirurgiã Milena Carvalho estava com uma cirurgia marcada, mas resolveu atender a paciente após muita insistência.

"Cheguei lá e ela simplesmente abriu meu sutiã, olhou e falou: 'Não tem o que fazer, volta pra casa'. Eu falei: 'Como assim vou voltar pra casa? Eu estou com minha roupa completamente coberta de sangue. Isso não é normal.' Nisso, ela falou apenas que eu tinha que esperar o meu organismo reagir. Eu fiquei em pânico. Ela só pediu para uma enfermeira colocar gaze nos meus seios e mandou eu ir para casa. Eu estava aérea, sem entender nada. No caminho só pensava comigo: 'Como ela vai me deixar assim? Meu Deus, o que está acontecendo comigo? Por que os pontos não estão fechando?'. Não sabia o que fazer", diz Marcella.

Com a situação fora de controle, Marcella precisou de ajuda e resolveu contratar uma enfermeira particular. O dinheiro não estava previsto no orçamento apertado, reservado apenas para os gastos com a cirurgia. A paciente, inclusive, ainda está pagando pelo empréstimo que fez para quitar o pós-operatório. Além disso, fez uma bateria de exames para entender o que estava acontecendo com os seios. Custos que ela não previa.

"Meus seios estão totalmente deformados. Cada dia que passa eu não acredito no que aconteceu. Eu olho pra mim e não consigo acreditar que passei dois anos pra juntar todo esse dinheiro e tudo foi em vão. Para mim, ela me mutilou", disse.

O sonho que virou pesadelo

A cirurgia de Carolina ocorreu em 1º de julho de 2021, no mesmo local. Às 11h, a médica começou os preparativos para realizar mais uma lipoaspiração e abdominoplastia, procedimentos que buscam retirar o excesso de gordura da barriga e do abdômen. O procedimento custou ao todo R$ 30 mil. Após 10 horas de cirurgia, a paciente foi levada para a sala de recuperação. No dia seguinte, recebeu alta e foi para casa.

"Eu estava no quarto de recuperação e minha família sequer foi avisada. Lá eu reparei que o meu abdômen estava muito roxo. Com o passar dos dias a aparência foi só piorando. Eu, a todo momento, avisava a doutora Milena o que estava acontecendo. Ela pediu para eu ir à uma clínica e assim eu fiz. Quando cheguei lá, um outro médico disse que eu estava com necrose em toda extensão abdominal. Fiz um tratamento, mas depois de 10 dias a incisão começou a abrir. Mais uma vez entrei em contato com a doutora Milena, mas ela disse que era normal e me pediu para usar óleo de ozônio", relata Carolina.

"Passei meses fazendo vários tratamentos. Hoje eu estou deprimida", relata Carolina | Arquivo Pessoal

Em casa, a paciente percebeu que a situação estava se agravando. Após mais de 20 dias do procedimento, em 22 de julho, Carolina notou que um líquido estava saindo da região do abdômen. Voltou a contatar a médica Milena Carvalho solicitando um suporte maior. No dia seguinte, funcionários de um laboratório foram à casa dela coletar sangue e uma pequena amostra da ferida para fazer uma biópsia.

"Recebi uma ligação do laboratório dizendo que a minha taxa de hemoglobina estava baixa, na casa dos 6. Sendo que o normal é entre 12 e 15. Segundo esse exame, eu estava com anemia. Eles tentaram contato com a doutora Milena, mas ninguém conseguiu falar com ela", diz a paciente.

Sem ter respostas e preocupada com o que estava acontecendo, Carolina decidiu ir à emergência de um hospital particular da capital federal. Chegando no local, foi identificado que o estado dela era grave. A equipe médica solicitou uma transfusão sanguínea e a internou na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) da rede hospitalar.

"Após 8 dias sem responder a ninguém, enquanto eu estava internada em estado grave, a médica apareceu como se nada tivesse acontecido. Inclusive, ouvi ela dizendo que o ocorrido foi devido a minha obesidade. Dias depois, passei por um novo procedimento cirúrgico para realizar uma limpeza do local necrosado e fazer enxerto para cobrir todo o buraco que ficou na região. Passei meses fazendo vários tratamentos. Fui liberada para voltar a trabalhar somente em novembro do ano passado. Hoje eu estou deprimida, choro sempre quando me vejo e me sinto decepcionada e muito magoada em ver que meu sonho virou um pesadelo", descreveu Carolina. 

Uma dor insuportável

Vera tinha como meta de vida colocar silicone nos seios. Após anos, conseguiu juntar R$ 13 mil, valor suficiente para pagar o procedimento cirúrgico. Em novembro de 2020, ela estava saindo de uma sala no Centro Clínico do Jardim Botânico com o sonho realizado. Mas dias depois, problemas foram aparecendo.

"Depois da cirurgia eu comecei a sentir muito desconforto na mama direita. Uma dor insuportável. Meu seio ficou inchado e os pontos começaram a abrir. Inclusive, começou a sair seroma do meu mamilo. Eu estava achando a situação estranha, então entrei em contato com a doutora Milena por um aplicativo de mensagens. Enviei fotos e expliquei o que estava acontecendo. Mas ela dizia apenas que os meus peitos estavam lindos", conta Vera.

"Uma dor insuportável. Meu seio ficou inchado e os pontos começaram a abrir", conta Vera | Arquivo Pessoal

Após algumas conversas, a médica Milena Carvalho teria receitado à paciente a aplicação de rifocina, medicamento indicado para o tratamento de infecções na pele causadas por microrganismos. Vera usou o remédio nos seios durante três meses. Semanalmente entrava em contato com a cirurgiã informando da situação e solicitando uma consulta. Mas a profissional dizia estar sempre ocupada, com a agenda lotada.

"Eu comecei a notar que um dos meus seios estava ficando necrosado. Como não conseguia atendimento com a doutora Milena, optei por procurar outro médico. Na primeira consulta ele me informou que o meu peito realmente necrosou e que eu ficaria com sequelas permanentes. Fiquei sem acreditar, pasma com o que estava acontecendo comigo", relata a paciente.

Cerca de oito meses depois, Vera retornou à clínica para ver a possibilidade de fazer uma reparação nas lesões. Ao todo, foram gastos R$ 16 mil com a cirurgia e mais R$ 6 mil com medicamentos e profissionais que ajudaram no tratamento das anomalias causadas nos seios.

"A doutora simplesmente olhou para mim e disse que não era possível. Falou assim: 'Te indico fazer uma tatuagem na região da aréola para refazer o bico do mamilo'. Eu fiquei incrédula. Hoje eu estou muito chocada com tudo o que aconteceu, totalmente traumatizada. Faço tratamento psiquiátrico por causa dessa situação. Meus peitos ainda doem muito e ficam ardendo quase que diariamente. Estou totalmente abalada", conta.
 

Pedi socorro várias vezes

"A doutora Milena Carvalho não me disse sobre as várias possibilidades de intercorrências." Esse é o relato de Jéssica que, depois da cirurgia teve inúmeros problemas e várias idas à emergência. "Chegou a ponto do meu peito começar a vazar seroma preto quase todos os dias. Tudo depois que eu fiz a cirurgia de mamoplastia, mastoplastia com prótese e lipoaspiração lateral. Ela falou somente que eu iria ficar linda, maravilhosa e que era para eu confiar no trabalho dela.  Jéssica continua tendo problemas de saúde. 2021 estava marcado para ser o ano em que ela realizaria o sonho de ter o "corpo perfeito''. Hoje, vive um trauma.

"Depois que os problemas pós-operatórios foram aparecendo, ela começou a colocar a culpa em mim, dizendo que joguei praga na cirurgia. Eu mostrava as fotos dos meus seios para ela, e ela dizia apenas que eu estava linda. Sendo que à noite eu tinha que tomar morfina porque estava sentindo muita dor. E ela dizendo que era normal. Eu tive que arrancar uma das aréolas porque necrosou. Fiquei tão mal que chegou a ponto da doutora Milena mandar eu tomar antidepressivo e não contar para ninguém. Eu disse que não, pois ela não era psiquiatra e não podia fazer aquilo", narra Jéssica.

A paciente fez exames de imagem e sangue para apresentar à cirurgiã. Porém, com os ocorridos, acabou desistindo de ir ao consultório por medo. Jéssica afirma que chegou a contar em um grupo a situação que ela estava vivendo. E, que, após ter feito isso, a cirurgiã ameaçou abandonar o tratamento e disse que nenhum outro médico pegaria o caso dela.

"Expus a situação e ela fez várias ameaças. Na última vez que a encontrei relatei que queria tirar as próteses pois não aguentava mais essa situação. Cheguei a fazer sessões de hiperbárica para ver se melhorava em algo. Hoje eu só quero ficar bem. Não confio mais na doutora Milena. Quando tudo estava acontecendo eu cheguei a pedir socorro para ela várias vezes. Ela dizia que eu estava linda. Depois das minhas queixas, começou a falar que eu estava abalada psicologicamente e estava exagerando, pois não era nada grave. Inclusive, uma vez eu desabafei com ela dizendo o que estava sentindo, que não tinha mais forças para lutar. Ela olhou pra mim e disse que eu era fraca, que outras pacientes não reclamavam tanto quanto eu", afirma. 


Culpa da idade?

Em outubro de 2020, Leila, aos 60 anos de idade, foi operada pela médica Milena Carvalho. Na ocasião, a cirurgiã realizou uma mamoplastia e colocou próteses de silicone nos seios. Todo o procedimento foi pago pelo irmão, que resolveu presenteá-la com a cirurgia. Parecido com o relato de outras pacientes, Leila também contou que o pesadelo começou dias após a intervenção médica.

"Eu mandava mensagens e enviava fotos mostrando que os meus peitos estavam estranhos, que os pontos não estavam fechando e que tinham feridas. Ela apenas dizia que era assim mesmo e que estava tudo bem", expõe a paciente.

Com o passar do tempo a situação se agravou. Leila começou a perceber que as feridas estavam cada vez maiores e os pontos não cicatrizavam. Ao entrar em contato com cirurgiã, a mesma pedia apenas para a paciente hidratar os seios e passar óleo ozonizado (espécie de óleo natural extra virgem enriquecido com Ozônio, um gás bastante reativo e com diversos benefícios à saúde). Em um print registrado pela suposta vítima em um aplicativo de mensagens, é possível ver que a médica a indica fazer uma cirurgia na barriga.

Troca de mensagens entre Leila e a médica | Arquivo Pessoal

"Ela sempre me humilhava. Quando eu falava que precisava fazer uma cirurgia para reparar o que aconteceu com o meu peito, ela não falava nada. Enquanto isso, a situação só piorava. Tudo o que acontecia, ela jogava a culpa em mim. Em uma das vezes ela disse que a cirurgia tinha dado problema por causa da minha idade, porque eu tinha 60 anos e meus peitos já estavam velhos. Sendo que antes do procedimento ela nunca falou nada. Apenas disse que eu ia ficar linda e com o peito dos meus sonhos", conta a paciente.

"Fiquei meses sem pegar meu filho no colo"

Bárbara colocou próteses de silicone nos seios em outubro de 2020. Desde então, a paciente relata que teve muitos problemas, principalmente porque os pontos não cicatrizavam.

"Eu relatava à doutora Milena que estava sentindo muitas dores na ferida e que ela estava aumentando muito de tamanho. Ela não fazia absolutamente nada. Falava apenas que era normal, que era um processo comum e que eu precisava respeitar o tempo do meu corpo. Pedia para eu passar óleo ozonizado e repousar. Eu segui isso à risca. Fiquei meses sem pegar meu filho no colo e sem dirigir. Ainda é uma situação que me causa muita angústia", diz Bárbara.

Por causa dos problemas causados no pós-operatório, a paciente decidiu contratar uma enfermeira particular na tentativa de ajudar com o tratamento. Bárbara relatou que a prótese colocada pela cirurgiã chegou a ficar exposta porque os pontos se abriram.

Sentimento de negligência

Em julho de 2021, após sair do Centro Clínico, o namorado de Márcia notou que ela estava com um buraco próximo de uma das axilas. A paciente tinha colocado próteses de silicone nos seios. Com receio de que algo poderia estar errado, imediatamente entrou em contato com a cirurgiã Milena Carvalho.Passando alguns dias, a paciente começou a sentir uma forte dor no peito esquerdo. Decidiu ir ao consultório da médica Milena Carvalho questionar o ocorrido. A cirurgiã informou que estava tudo dentro do esperado.

"Eu mandei mensagem e uma foto para ela, pois uma das axilas estava com buraco e a outra não. Pensei que ela tinha esquecido de fechar. Ela respondeu que era normal, era para drenar. Porém, não estava com dreno. Achei estranho e falei com algumas amigas que tinham colocado silicone. Todas me disseram que tinham colocado ponto em tudo e nada tinha ficado aberto. Fiquei muito assustada, mas por sorte o buraco fechou depois de três dias", informa Márcia.

Passando alguns dias, a paciente começou a sentir uma forte dor no peito esquerdo. Decidiu, então, ir ao consultório da médica Milena Carvalho. Chegando ao local, disse que havia uma marca escura no corte feito por ela. Em seguida, perguntou se estava tudo dentro dos conformes. A cirurgiã apenas informou que era normal.

"Eu não acredito que estava tudo bem. Eu acho que ela forçou para enfiar as próteses e acabou rasgando a minha pele. Inclusive, mais ou menos três semanas depois eu comecei a ficar com uma alergia nos seios. Não tem como ela falar que estava tudo bem. É uma cirurgia 'simples', pois é o procedimento que ela mais faz. Acho que ela devia ter feito o corte do tamanho exato para não precisar me rasgar. Me senti negligenciada. Antes da cirurgia ela disse que era perfeccionista, que tinha mãos de ouro e eu criei muita expectativa. Mas não foi o que aconteceu. Se tivesse feito com outro, provavelmente não teria ficado com nenhuma marca", narra Márcia.

A dificuldade em pagar pelo erro

"Após a cirurgia eu tive uma alteração na minha mama direita. Fiquei assustada e decidi ir ao consultório para saber o que tinha acontecido. Se era algo grave ou não. Retornei mais duas vezes à clínica. Na última, ela decidiu retirar minhas próteses. Como eu não tinha dinheiro para pagar uma clínica, ela simplesmente falou que iria retirar dentro do consultório" relata Gabriela. 

A paciente pagou R$ 11 mil pelo procedimento cirúrgico e, depois do ocorrido, gastou mais R$ 7 mil com remédios e outra cirurgia para reparar os danos causados pela primeira. "Eu trabalho como diarista. Passei meses economizando para pagar a cirurgia. Cheguei até a fazer empréstimo. Tudo para realizar meu sonho. A situação mexeu muito com o meu psicológico. Eu tinha o sonho de colocar silicone e infelizmente isso não aconteceu. É muito triste", narra.

A cirurgia ocorreu dia 8 de março de 2021. Até então, o sonho de colocar próteses de silicone tinha sido realizado conforme o planejado. Porém, dias depois do procedimento, os primeiros problemas começaram a aparecer: "Eu estava sentindo muita dor, mesmo assim ela apenas aplicou uma anestesia local e retirou as próteses". 

Gabriela teve as próteses retiradas dentro do consultório | Arquivo Pessoal 


Não aguentava tantas dores

Em dezembro de 2020, próximo às datas de Natal e Ano Novo, Giovanna chegou ao Centro Clínico para ser submetida a uma cirurgia de inclusão de próteses nas mamas. O valor acertado para o procedimento foi de R$ 9 mil. Ela só não imaginava que no mesmo mês teria problemas em decorrência da cirurgia. 

"No mesmo dia que eu saí da sala cirúrgica eu percebi que as minhas mamas estavam estranhas. No meu peito esquerdo eu sentia muito desconforto, parecia que o meio seio estava preso em algo. Fora isso, apenas na mama esquerda eu tive muito seroma. Na mama direita nunca senti nada, mas na esquerda era horrível. A sensação é que a prótese virou um tijolo e colou no meu tórax", expõe Giovanna. 

A paciente esperou três meses para ver se a situação da mama iria melhorar. Após 100 dias, o caso era o mesmo. Giovanna relatou à cirurgiã Milena Carvalho que não aguentava mais as dores e os incômodos. A médica sugeriu um reparo médico, mas para isso Giovanna teria que desembolsar mais R$ 1.700 reais. 

"Ela disse que removeria a prótese, lavaria e colocaria novamente. Eu aceitei e paguei o valor pelo reparo. No entanto, eu simplesmente saí da mesma forma que entrei. Acho que ela só abriu e mexeu a prótese com o dedo, pois eu permaneci da mesma forma. Nem inchaço de pós-operatório eu tive. Depois disso eu realmente percebi que estava em uma situação complicada. Enquanto isso, ela afirmando que fez isso e aquilo. Fiquei totalmente frustrada, triste, sem saber como resolver a situação", conta a paciente.

Após as cirurgias, Giovanna tentou negociar os valores com a médica mas nunca teve respostas. Ao todo, pagou cerca de R$ 11 mil pelos procedimentos: "Considerando a ausência decente de suporte médico, eu procurei opiniões de cirurgiões plásticos que afirmaram que meu caso não era de reversão de cirurgia, mas sim de correção. Os exames mostraram que eu estou com a prótese rígida e contraturando. Um médico me receitou um medicamento específico mas não resolveu, então só com cirurgia mesmo. Finalmente tive um acompanhamento médico, pois a cirurgiã Milena nunca me receitou um remédio. Desde a cirurgia eu não malho mais, não forço pra pegar objetos pesados."


Sem poder dirigir ou viajar: saí do consultório com trombose

O relato de Cláudia é o mais dramático de todos os casos citados acima. Assim como a própria paciente descreve, as sequelas foram internas e não externas. Isso porque após o procedimento cirúrgico, ela foi diagnosticada com trombose venosa cerebral e jugular com infarto cerebral. Ela se diz vítima da situação e acredita que tudo foi provocado por erros causados durante uma cirurgia realizada pela médica.

Em abril de 2021, Cláudia passou por uma cirurgia de inserção de próteses de silicone e lipoescultura corporal. Entrou às 11h no centro cirúrgico e saiu nove horas depois, às 22h. De lá, foi para o apartamento alugado para ser submetida aos tratamentos do pós-operatório. No dia seguinte, também pela manhã, teve alta médica autorizada pela cirurgiã Milena Carvalho.

"O problema já começou naquele dia, pois uma funcionária havia esquecido as cintas cirúrgicas que eu precisava usar no pós-operatório e eu tive que ir para casa sem a faixa. No mesmo dia, usei uma medicação indicada pela doutora Milena, mas fiquei com muita taquicardia, minha pressão subiu bastante, chegou a 16/10. Os batimentos cardíacos ficaram a 133 por minuto. Fora tudo isso, passei dias usando uma sonda que me causava muita dor no local da incisão e parecia não estar funcionando direito. Achei tudo estranho, mas pensei que poderia ser algo do pós-operatório", relata a paciente.

Cláudia disse que passados alguns dias da cirurgia, começou a sentir dores nos ouvidos e na cabeça. Inclusive, um dia acordou com a visão completamente turva e tendo confusão mental. Não conseguia sequer reconhecer os próprios familiares.

"Ela apenas disse que da parte dela foi um sucesso e que eu deveria falar com o anestesista para saber se tinha acontecido algo. O anestesista disse para eu procurar um neurologista. Assim fiz. Após uma série de exames, saiu o resultado. Eu estava com trombose venosa cerebral e jugular com infarto cerebral. Imediatamente o neurologista solicitou minha internação, pois eu corria risco de vida", conta.

Após o ocorrido, Cláudia continuou visitando a doutora Milena Carvalho todos os meses. No entanto, a paciente diz que a médica apenas a informava que estava tudo bem e tudo tinha sido um sucesso. "Foi um completo descaso comigo. ela nunca perguntou sobre o meu estado de saúde ou como estava o tratamento, nem participou quando descobri a trombose", diz.

"Atualmente, faço tratamento neurológico, psicoterapêutico e fisioterápico. Tudo em função das sequelas deixadas pelas enfermidades geradas após a cirurgia. Não posso dirigir pelas sequelas motoras, não posso viajar em função do tempo que fico sentada e também pela pressão do avião, e não posso estudar porque tive a memória recente afetada. E dentro de tudo isso a cirurgiã Milena Carvalho nunca quis saber como eu estava ou estou", conclui Cláudia.


E agora?

Apesar das 20 denúncias contra Milena Carvalho, a médica continua atuando normalmente. O  Conselho Regional de Medicina (CRM) do Distrito Federal não suspendeu o registro da profissional e não soube informar se a cirurgiã foi denunciada alguma outra vez, ou se já teve o registro suspenso. O Conselho também disse não ter dados sobre a quantidade de cirurgiões plásticos denunciados por negligência médica. 

Em nota, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) afirmou que a médica foi suspensa, em agosto de 2021, por "infringir regimentos internos". A suspensão não tem ligação com as denúncias. De acordo com a entidade, a decisãoocorreuporque a médica fez "autopromoção nas redes sociais", o que fere o regimento da SBCP. Com isso, a cirurgiã perde benefícios disponíveis aos associados. A suspensão vai até fevereiro deste ano. 

A Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica explicou que apenas o CRM pode impedir um profissional de exercer a função médica. A entidade afirmou que em casos de cirurgias plásticas, o recomendado é o paciente ser acompanhado de perto pela profissional que realizou o procedimento.

O Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal informou ter sido notificado das denúncias em relação à cirurgiã Milena Carvalho e que há uma sindicância em andamento. O órgão disse apurar qualquer acusação após receber denúncias ou por iniciativa do próprio Conselho e, que após o julgamento, pode estabelecer cinco tipos de penalizações. 


SBT News

O SBT News produziu essa matéria com o intuito apenas de contar o drama vivido por essas mulheres, sem qualquer pré-julgamento ou condenação em relação à cirurgiã plástica Milena Carvalho, citada diversas vezes ao longo do texto. O SBT News reforça a imparcialidade em todas as reportagens, buscando mostrar todos os lados envolvidos. Assim como os relatos das pacientes que se dizem vítimas.

Em nota encaminhada à reportagem um dia após a publicação do texto, a defesa da médica disse repudiar as acusações anônimas de não ter prestado apoio pós-operatório a qualquer paciente.

"A médica afirma que segue rígidos protocolos de cuidados e que acompanha seus pacientes antes, durante e depois dos procedimentos. Mesmo naqueles casos em que os pacientes não cumpriram o necessário protocolo, ela sempre esteve inteiramente à disposição para atender e solucionar qualquer situação que tenha ocorrido", diz trecho do comunicado.

A defesa da profissional também afirma que a equipe médica de Milena Carvalho segue uma rotina de acompanhamento após os procedimentos e que em 2021, a médica realizou mais de 200 cirurgias. "A grande maioria das pacientes está totalmente satisfeita com o resultado dos procedimentos".

 *Estagiário sob supervisão de Leonardo Cavalcanti

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